O sono na doença renal crónica

Mulher que não consegue dormir


O sono é uma necessidade vital, à semelhança da sede ou da fome. Para além de melhorar a concentração, preservar a memória e aumentar a capacidade de aprendizagem, o sono é essencial para a produção de hormonas presentes no organismo, contribuindo para a saúde e bem-estar.

A privação do sono tem consequências na qualidade de vida, na morbilidade e na mortalidade. Este problema é frequentemente subdiagnosticado e subvalorizado.

Um estudo apresentado pela Sociedade Americana de Nefrologia aponta que as pessoas com doença renal crónica que não têm um sono de qualidade apresentam uma pior função renal. Apesar de existir uma evidência crescente de que os distúrbios do sono são comuns nos indivíduos com doença renal crónica, a sua associação com a progressão da doença ainda não é conhecida.

 

A doença renal crónica e os distúrbios do sono

O tempo em diálise, a idade avançada, o horário do turno de diálise, a restrição de líquidos e alimentos, as cãibras musculares, a medicação ou a incerteza sobre o seu futuro, constituem fatores que comprometem a qualidade do sono dos doentes renais crónicos.

A perda de memória, o cansaço físico, a diminuição da imunidade, o risco de hipertensão, o acidente vascular cerebral, a obesidade e a diabetes são algumas das consequências das perturbações do sono.

Os distúrbios mais frequentes são a insónia, a síndrome de apneia obstrutiva do sono e a síndrome das pernas inquietas.

 

 
Mulher que não consegue dormir
 

1. Insónia

  • Caracteriza-se pela dificuldade em adormecer e piora com o avançar da idade;

  • Pode afetar o doente no início da noite, quando vai para a cama e não consegue adormecer, ou surgir a meio da noite, quando acorda e tem dificuldade em adormecer;

  • Pode ser uma consequência do stress, gerando habitualmente um aumento da ansiedade; 

  • Outras fatores, como a síndrome das pernas inquietas ou os movimentos periódicos dos membros, a apneia do sono, certos medicamentos, a dor óssea, a ansiedade, a depressão e os distúrbios do ritmo circadiano são apontados como a causa de insónia;

  • O tratamento da insónia tem como objetivo quebrar este ciclo.

 

 
Mulher a dormir
 

2. Apneia do sono

  • Consiste no bloqueio das vias aéreas respiratórias;

  • A sobrecarga de volume e a neuropatia ou miopatia associadas à uremia crónica ou às causas subjacentes da doença renal crónica, como a diabetes, podem contribuir para esta situação;

  • Os sintomas incluem roncos, pausas respiratórias, sono agitado, transpiração e a maior necessidade de urinar durante a noite;

  • Algumas das suas consequências compreendem a perda de memória, o cansaço físico, a diminuição da imunidade, o maior risco de hipertensão, o maior risco de acidente vascular cerebral, a obesidade e a diabetes;

  • Os doentes com insuficiência renal crónica terminal podem não ter as manifestações típicas da apneia do sono, podendo ser necessária uma monitorização objetiva para excluir o diagnóstico;

  • A decisão de tratar a apneia do sono para a redução do risco cardiovascular deve ser individualizada para cada paciente;

  • O tratamento é o mesmo que para a população em geral.

 

 
Jovem sentado
 

3. Síndrome das pernas inquietas

  • A síndrome das pernas inquietas refere-se a uma sensação desagradável nas pernas (e ocasionalmente nos braços), acompanhada por um desejo de as mover, tipicamente à noite ou início da noite, que é pior durante períodos de inatividade e temporariamente aliviada por movimento;

  • Pode ser acompanhada de dor, cãibras, formigueiro ou tensão muscular;

  • Geralmente, os sintomas surgem em períodos de maior repouso, obrigando a pessoa a levantar-se e a caminhar para aliviar o desconforto, condicionado a vida do doente;

  • A anemia, a deficiência em ferro, a uremia, o cálcio sérico elevado, as alterações do sistema nervoso central e periférico e alguns medicamentos, como os antidepressivos, contribuem para este distúrbio do sono;

  • O tratamento farmacológico passa pela correção dos fatores acima identificados.

 

Há comportamentos que podem melhorar a qualidade do sono.

 

Conselhos para melhorar a qualidade do sono

  1. Pratique exercício físico com regularidade;

  2. Acorde sempre à mesma hora;

  3. Evite as sestas;

  4. Evite a ingestão de açúcar depois das 18 h;

  5. Jante duas a três horas antes de ir dormir;

  6. Vá para a cama apenas quando tiver sono;

  7. Não veja televisão no quarto;

  8. Evite ver programas de televisão que lhe provoquem ansiedade;

  9. Evite usar o telemóvel no quarto;

  10. Pratique meditação.

 

Conclusão

As diferentes terapêuticas de substituição da função renal podem ter diferentes impactos nos distúrbios do sono nos doentes renais crónicos.  

As técnicas de diálise noturna (como a hemodiálise noturna ou a diálise peritoneal automatizada) parecem ter um impacto positivo na síndrome de apneia obstrutiva do sono, possivelmente pelo melhor controlo/maior ultrafiltração e mais fisiológica, mas pode agravar os problemas de insónia associados à preocupação que geram, pela necessidade de autocuidado ou pelos alarmes que se podem associar da máquina. 

Ao transplante renal está associado uma melhoria da qualidade do sono.

 

Se tem distúrbios do sono, fale com o seu médico assistente.

Cuidar da sua função renal passa também pela qualidade do seu sono.

 

Ana Farinha - Nefrologista 

Bibliografia

  • Santos, A. (2020). Perturbação do sono e a doença renal crónica. Atlas da Saúde.

  • Santos, R. (2016). Distúrbios do movimento relacionados ao sono e doença renal crónica. Sociedade Brasileira de Nefrologia.

  • Santos, R. (2016). Distúrbios do sono e doença renal crónica. Sociedade Brasileira de Nefrologia.

Imagens de Isabella and Louisa Fischer, Alexandra Gorn, Tom Rogerson e Rodrigo Pereira via Unsplash